Construir marcas que agreguem valor à empresa e seus produtos é um dos pilares de qualquer manual de gerência. No momento, a marca mais valiosa do mundo é a Apple, que reúne marca forte e retorno comercial. No entanto, muitas marcas bastante conhecidas e admiradas estão hoje entre as empresas em decadência e com produção em queda, sem que a marca possa alterar esta realidade. Entre as cem marcas mais valiosas do mundo, apenas uma brasileira, a Petrobras, em 75º lugar. Afinal, uma marca com forte reconhecimento pelo público é ou não uma necessidade?
Não posso seguir este texto sem lembrar um episódio inesquecível sobre o assunto. Numa reunião do conselho de administração de uma grande instituição de ensino (da qual faziam parte empresários muito conhecidos), o representante de uma das maiores empresas brasileiras, cada vez mais internacional, pede a palavra e afirma num tom vigoroso:
- Para mim e para minha empresa, marca e vento são a mesma coisa. O que me interessa é o EBITDA, só o EBITDA, sempre o EBITDA.
Claro que a reunião perdeu o rumo e por pouco não tivemos que chamar tropas da ONU. Nem sob tortura confesso o nome do personagem, de altíssimo respeito no mercado.
Você já leu um livro chamado No Logo? Então leia. A autora trabalha a ideia de que chegamos a um ponto da história econômica em que marcas de produtos devem ser abandonadas, senão proibidas, pois elas nos amarram a decisões baseadas na massificação da publicidade, na identificação visual do produto e muitas vezes por apelos inconscientes aos instintos mais primitivos, tais como o medo, a familiaridade e até mesmo o erotismo. A autora diz ainda que o fim das marcas levaria a uma redução significativa dos preços dos produtos e a um aumento expressivo da concorrência, especialmente em produtos de consumo pessoal e alimentos.
Jack London |
Duas experiências são muito conhecidas: a primeira, dos remédios genéricos brasileiros, muito mais baratos que os remédios de marca, hoje quase predominantes no mercado, sem royalties e sem logo. Outro é o cantor Prince, que mudou sem nome para 1(One) e continua sua carreira. Essa é uma discussão em aberto, saudável e atual, onde não há vencidos nem vencedores, da qual você deveria participar.
Outro campo em que a palavra marca exerce sua presença é no encaixe inevitável entre vida e pessoa. Cortar uma vida a fio é uma tarefa complicada, que usa sempre um ou outro ponto de vista. A corrida que empreendemos durante a existência consome quase tudo, até o momento em que encontramos nossos limites. O comerciante se contenta com o pequeno varejo, o político se percebe apenas municipal e o sábio se percebe apenas mais um a discutir nos botequins. É neste ponto que ganhamos uma marca, uma forma qualquer de sermos reconhecidos por gentes e coisas.
Mas não há momento mais delicado para o reconhecimento desta marca humana do que o momento da morte, do fim da materialidade. As formas mais comuns de homenagear os que se vão são manifestações de saudade, ausência, carinho e testemunhos de amor familiar.
Há poucos dias perdi um amigo, George Ellis, um dos pioneiros da internet brasileira, sócio da primeira empresa de TI a abrir seu capital no Brasil. A família, num gesto absolutamente merecido, estampou nos anúncios a seguinte frase: Um Homem Bom.
Na mosca, este era ele, e esta é a marca que carregou durante a vida.
Mas nada se compara a um anúncio espantoso e certamente inédito que encontrei recentemente. Amigos de trabalho do falecido Geraldo A.G.G. Neves fazem publicar no jornal O Globo um convite para a missa de sétimo dia com o seguinte texto:
Geraldo A.G.G. Neves – Um Dos Maiores Exemplos de Amor a uma Marca no Mundo
Não sabemos o que acham os parentes de Geraldo, a mãe, os irmãos, os filhos, quem sabe, sobre a maior qualidade que ele expressou e exerceu em vida.
Mas sabemos que Geraldo, ao qual desejo um respeitoso descanso, eterno e em paz, termina seus dias como o único link que conheço entre as duas marcas: a marca humana e a marca de um produto.
E não um amor qualquer, mas o maior amor do mundo.
Para não haver dúvida sobre o acontecido, que sempre pode ser um “causo” inventado pelo autor, segue a cópia do anúncio.
Nesta loucura do terceiro milênio, quem sabe você não conhece alguém que hoje, em vida, já esteja a merecer, em seu último momento, a referência de “O maior amor do mundo pela marca Apple” ou “O maior amor do universo pela marca Google”?
Afinal, o que será mais importante para sua empresa: investir na marca, no desempenho comercial expressivo e rentável ou num relacionamento expressivo e ativo com seus consumidores?
Fonte: Pegn