Em 2 de junho de 2002, um dia antes de estrear na Copa da Ásia, a seleção brasileira praticamente não existia.
Rivaldo, o craque, era uma incógnita por sua condição física. Ronaldo, o
artilheiro, nem se fala. Emerson, o capitão, a voz do chefe, deslocou o
ombro e foi cortado.
Tudo isso depois de uma campanha vacilante nas eliminatórias, que
resultou nas demissões de Leão e Vanderlei Luxemburgo e na contratação
de Luiz Felipe Scolari.
Fora de campo, a situação era pior. As contas e as transações da CBF e
de seu presidente, Ricardo Teixeira, haviam sido devassadas por uma CPI.
O Campeonato Brasileiro de 2002 não tinha tabela nem fórmula definidas.
Ainda havia algum clamor pela presença de Romário na seleção, e Pelé
personificava a desconfiança que pairava sobre o time. "Meus favoritos
são Argentina, França Itália e Inglaterra", disse o Rei, sobre seleções
que nem sequer atingiram as semifinais.
A preparação da seleção levantou ainda mais dúvidas.
No último amistoso, antes da estreia, o Brasil ganhou da Malásia, mas
"Ronaldinho, Rivaldo e Ronaldo foram as maiores decepções", segundo
relato da Folha.
Até Luiz Felipe Scolari tinha dúvidas sobre a condição física do Fenômeno.
"O Ronaldo não pode, em dois, três, quatro meses voltar a ser o mesmo jogador do passado", dizia o treinador.
A Copa de 2002 foi pródiga em mostrar que há mesmo males que vêm para o bem.
"Quando você apanha muito, se fecha, se abraça a sua família", lembra o
preparador físico Paulo Paixão. "Aquela conversa de 'Família Scolari'
era verdadeira."
Procurado por meio de sua assessoria, Scolari afirmou que não falaria com a Folha.
Um dia antes do primeiro jogo da Copa, contra a Turquia, a seleção
perdeu o capitão Emerson, que se machucou gravemente durante um rachão
--jogava no gol.
Ricardinho foi convocado às pressas, e Gilberto Silva foi alçado à condição de titular.
O capitão, por influência dos jogadores, virou Cafu, embora o preferido
do técnico fosse o zagueiro Roque Júnior --havia assumido a faixa em
jogos anteriores, quando Emerson fora substituído.
O Brasil precisou de um pênalti inventado para ganhar da Turquia na
estreia. A fragilidade dos outros dois rivais na primeira fase ajudou.
A seleção goleou China (4 a 0) e Costa Rica (5 a 2) e se classificou sem
sustos para as oitavas, enquanto "favoritas" como Argentina e França
morriam na primeira fase.
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O Brasil venceu por 2 a 0, mas sofreu em boa parte do jogo e também contou com a anulação de um gol belga.
Ao recuperar Ronaldo e Rivaldo, Runco e Paixão viraram estrelas daquele
time --eram tão solicitados para entrevistas quanto os principais
jogadores ou o treinador.
Nove dos 11 titulares passaram em algum momento pelo departamento médico durante aquela campanha.
"O mais importante é que lá dentro nunca houve dúvida, o respaldo era
total, do treinador, do presidente, de todos", conta Paixão.
Para Runco, os jogadores só chegaram inteiros à decisão porque se
dedicaram muito. "Quando o atleta se ajuda, não tem como ser diferente",
conta o médico.
Ronaldinho acabou com os ingleses nas quartas, Ronaldo fez de bico o gol decisivo na semifinal contra os turcos.
A decisão, primeiro confronto entre Brasil e Alemanha na história das
Copas, foi uma aula do time de Scolari --de Marcos a Ronaldo.
E a seleção que saiu do Brasil desacreditada após a maior crise de sua história, voltou com o quinto título.
Fonte: Folha.com edição Lucas